Fundações e Estruturas
Por Eng. Carolina Paese, 31 de agosto de 2017
A vistoria de vizinhança tem por finalidade: “constatar anomalias e falhas existentes nos sistemas construtivos e “perpetuar a memória” das características físicas e do estado de conservação de edificações e benfeitorias localizadas na área de influência de um canteiro de obras. Fornecer informações técnicas aparentes que possam auxiliar na definição de procedimentos construtivos e na execução de serviços preliminares à obra (IBAPE SP, 2013)”.
As vistorias em edificações podem abranger todas as fases do produto imobiliário: planejamento pré-obra (vizinhança ou cautelar), projeto (protótipo), execução da obra e pós-obra. Destaca-se neste caso a vistoria de vizinhança, a qual deve ser executada para evitar ou facilitar à apuração de eventuais danos ou litígios derivados da obra, resguardando o direito de ambas as partes. Sendo realizado este procedimento antes do início de construções, há a discriminação das anomalias e falhas que possam agravar e comprometer os imóveis adjacentes. Apesar da normatização, os vizinhos não são obrigados a receber os contratados pelas construtoras para a execução da vistoria.
A NBR 7.678:1983 (Segurança na execução de obras e serviços de construção) coloca que vistorias devem ser realizadas em “propriedades vizinhas em estado precário” e com “possibilidade de enfraquecimento de construções vizinhas por escavações, vibrações e explosões”. Pela NBR 12.722:1992 (Discriminação de serviços para construção de edifícios): “toda vez que for necessário resguardar interesses às propriedades vizinhas à obra (ou ao logradouro público) a ser executada, seja em virtude do tipo das fundações a executar, das escavações, aterros, sistemas de escoramento e estabilização, rebaixamento de lençol d’água, serviços provisórios ou definitivos a realizar, deve ser feita por profissional especializado habilitado uma vistoria”. Como resultados devem ser gerados uma planta de locação todas as edificações suscetíveis de sofrerem algum dano por efeito da execução da obra e as condições de fundação e estabilidade. As informações pertinentes ao laudo da vistoria são fixadas pela NBR 13.752:1996 (Perícias de engenharia na construção civil). Outras normas que tratam sobre os cuidados com as edificações vizinhas são as NBR 6.122:2010 (Projeto e execução de fundações) e NBR 8.044:1983 (Projeto geotécnico – Procedimento).
Apesar das diversas normas terem força de Lei, nem todas as construtoras e incorporadoras realizam as visitas técnicas de vistoria de vizinhos antes do início das suas obras. O primeiro sinal de que obras estão prejudicando os vizinhos normalmente são as fissuras em paredes, lajes e vigas. Muitas executam estas vistorias apenas quando este estágio é atingindo. Quando se tornam incômodas aos usuários das edificações vizinhas, existem casos que a fundação adjacente já tenha sofrido danos custosos a toda estrutura. A NBR 6.118:2014 (Projeto de estruturas de concreto – Procedimento) apresenta que quando “as fissuras passam a causar desconforto psicológico aos usuários, embora não representem perda de segurança da estrutura” é necessário o controle da fissuração quanto à aceitabilidade sensorial.
Uma prática muito comum entre as construtoras após a vistoria de vizinhança é o seu registro no cartório, pela Ata Notarial. Este não é obrigatório, mas oficializa a sua data de execução e se torna um documento perante a justiça. Entretanto, a obra não pode ser responsabilizada automaticamente. Deve-se realizar uma investigação por um perito especialista para constatar a origem do dano, causa e mecanismo.
O Art. 1.279 da Lei Federal nº 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro) discorre que “ainda que por decisão judicial devam ser toleradas as interferências, poderá o vizinho exigir a sua redução, ou eliminação, quando estas se tornarem possíveis”. O Art. 1.299 afirma que “O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos”. Este é complementado pelo Art. 1.311: “Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias”. Assim, “o proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido realizadas as obras acautelatórias” (Art. 1.311 – Parágrafo único).
Quando a vistoria de vizinhança não ocorre por outros motivos, como financeiros, a construtora pode ser acusada de negligência e/ou imprudência (Lei Federal nº 10.406/2002 – Art. 186 e 187), como supracitado. Até 2015, quando a Lei Federal nº 5.869/1973 (Antigo Código do Processo Civil Brasileiro) era vigente, aplicava-se a ação de nunciação de obra nova. O edifico vizinhos considerasse-se prejudicado, mesmo que a vistoria tenha sido realizada, estava no seu direito de entrar com o pedido. Os Arts. 934 a 940 garantiam esta ação.
No atual Código do Processo Civil Brasileiro (Lei Federal nº 13.105/2015) não há nenhum capítulo semelhante sobre a nunciação de obra nova. Segundo Araujo et. al., 2013, “a ação de nunciação de obra nova é de forma geral, o instrumento que a parte prejudicada por alguma construção de outrem, tem de recorrer ao judiciário, para embargar ou até mesmo impedir a construção da mesma, evitando assim danos ou prejuízos a sua propriedade”. Ela não tinha como objetivo a suspensão definitiva da obra, mas sim a sua modificação para que o vizinho não fosse prejudicado.